A rainha de ouros coroa a si mesma.
Tenho o sol sobre a cabeça. Devo sê-lo, aliás. Mas afinal - onde está o baixo clero? Não vejo a minha corte. E o povo - eu tinha certeza de ter um aqui. Onde foi que o deixei? Está silencioso ou é só insosso? Todos dormem ou não se encontram. Tanto lhes faz e tanto me faz. Não há tempo, dê-me logo isto aqui. Eu mesma me proclamo, inconteste. Com a unanimidade de uma só – melhor assim. * A rainha de copas casa consigo mesma. Foi-se minha época de sentar e esperar. Meu trono já está afundado e o do lado, encolhido. Mais cedo ou mais tarde é preciso escolher me unir a alguém. Mande já embora os candidatos - todos eles, uns coitados. Nunca vi tão mirrados. Nunca vi mais gordos. Chega de baile, já comeram demais. Em tempo, meu próprio dedo é o único onde cabe esse anel. E eu me declaro – marido e mulher. * A rainha de espadas executa a si mesma. Reconhecimento depois de morta? É apenas desaforo. De que me adianta? Diga-me o que farei com as florzinhas que me jogarem além de consentir que se enterrem comigo? Não tenho a pretensão de ficar para a posteridade. De Marcar A Humanidade. Deus me livre de eternidades. Cancele as grinaldas, essas guirlandas chorosas. Impeça também os tomates, os ovos. Por fim, proíba logo que me taquem pedras ou fogo. A morte aqui é na faca e eu mesma faço as honras. * A rainha de bastões roga a si mesma. Não está vendo que estou chamando há meses e Deus não comparece? Mandei os pombos, o mensageiro real. Mandei mimos, bálsamo e os melhores bombons. Mandei um convite com meu brasão e depois disparei uma intimação. Mandei Vir Aqui Agora - nem se digna. Não está à altura, não é digno. E se então sou eu que tenho de me rebaixar e ajoelhar por aquilo de que preciso, que eu o peça a quem possa me dar - Ó, coração meu, tende piedade de mim.
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